domingo, 24 de fevereiro de 2013

Texto: Hänsel und Gretchen

Era uma vez João, era uma vez Maria. João amava Maria, Maria não amava João, o passarinho comeu as migalhas e ambos morreram de fome. Não, ficou ruim. Deixe-me tentar de novo.

João. João era um passarinho. Maria era um pão que fora esmigalhado por dois pequenos vagabundos. João comeu Maria e só então Maria se sentiu completa. Não, duplo sentido desnecessário, história sem graça.

Maria. Maria era feliz em sua vida, casada, com filhos. João era um vagabundo que vivia embaixo da ponte. Uma vez Maria jogou uma migalha de pão para João. Não vejo uma continuação para essa história. Próxima.

João era João. Maria era Maria. João não conhecia Maria que não conhecia João (que não conhecia Maria, que não conhecia João).
João era João e João era um filha da puta. João fazia poesia para seduzir tantas outras marias. João tinha estilo.
Maria era Maria e Maria era de uma beleza oscilante e duvidosa.
Um dia João conheceu Maria e viu em seus olhos uma trilha de migalhas de pão.
Um dia Maria conheceu João e viu em seus olhos uma tristeza escondida e um coração partido.
João passou rápido por Maria, não lhe perguntou o nome, não lhe disse nada.
Maria olhou para trás.
No dia seguinte João morrera de overdose e Maria foi encontrada boiando no rio.
Não, muito triste.

João amava Maria que amava João. Eram plenamente felizes, só havia um obstáculo.
João era um pássaro e Maria uma gaiola.
Um certo dia a bruxa má decidiu libertar João de sua Maria. Como João não saísse, montou esta bruxa uma trilha de migalhas de pão. João se perdeu na floresta, desaprendeu a cantar e num certo dia caiu de uma árvore, como se já não voasse. Maria foi derretida e virou um lindo colar. Ainda não, próxima.

Maria fora feita para João e também João fora feito para Maria. Eram a mesma pessoa em corpos diferentes. Tinham os mesmos interesses, o mesmo nível de cultura, compartilhavam dos mesmos valores morais e das mesmas manias esquisitas. João amaria Maria e Maria amaria João. Maria morava na China e não se chamava Maria. João morava no Panamá e devia se chamar Juan. Nunca se conheceram. Quanto azar.
Mais uma, mais uma, por que não?

Once upon a time, in a land far, far away, there was a young man named John. He was not happy and had never been happy. In fact, he didn't even know what happinness meant.
However, neither was he sad. He existed and this existence was poor in meaning and in reason. One could say he filled the space, so that the existence of others would not be too empty.
Mary was the daughter of a King. She was, however, not a legitimate daughter. Mary was the daughter of a King without the perks of being the daughter of a King and without ever having her name remembered in history lessons.
When John first saw Mary, he was afraid.
When again he saw mary, he hated her.
When for a last time John saw Mary,he loved her and used that love to stop an arrow from going into her heart for an unknown reason. John died happilly. Mary lived and was forgotten.
Outra? Qualidade ou quantidade, pouco importa.

Kommt, Kinder, ich erzähle euch jetzt die Geschichte von Hänsel und Gretchen!
'Aber unsere Eltern haben uns diese Geschichte schon erzählt, Frau Eckemeier!'
Nein, Kinder, diese Geschichte die ich euch gleich erzähle, ist die Geschichte andere Hänseln und Gretchen!
'Ach so, Frau Eckemeier! Erzähle uns, bitte, bitte!'
Gretchen war eine Hexe und Hänsel war ein Vögel.
Gretchen liebte Hänsel und ihre Liebe hat ihm zur Mensch gemacht, so dass er sie auch lieben konnte.
('Frau Eckemeier, warum machst du so viele Fehler wann du Deutsch sprichst?' Halt deine Klappe Anne! Ich versuche eine Geschichte zu erzählen!)
Hänsel wollte aber kein Mensch sein. Und auch die Hexe wollte kein Vögel sein. Die Hexe frass Hänsel sodass er ein Teil sie sein wurde, obwohl er das nicht wollte. Ende.
Próxima, próxima.

Já era quase meio dia quando João conheceu Maria. E ela sorria, ele via! E a medida que acontecia de ela entrar no seu dia-a-dia, João logo percebia que também ele sorria.
Não havia mais dúvida, um novo amor surgia.
Pois João num certo dia de excesso de euforia, quis contar a Maria tudo o que sentia. Maria mal sabia que este amor existia, que por ela ele sorria e que ele a queria.
Pois Maria neste dia, depois de lavar as mãos na pia (?) procurou o seu João e disse que também sentia um amor que, todavia, não existia.
Ah! A alegria de João crescia, expandia! João finalmente vivia!
Por uma noite e um dia, foram João e Maria, depois Maria revelou, que na verdade mentia.
João já não sorria. Maria já se ia.
Vadia.
Mais uma, mais uma! Vamos aproveitar o entusiasmo!

Maria conheceu João no necrotério. Ela morrera em um acidente de carro e ele de assassinato.
'Você imaginava dar pra se comunicar depois de morto?' soltou João, tentando iniciar um diálogo.
Maria sorriu, respondeu que não e eles ficaram lá conversando.
A medida que os corpos esfriavam, a conversa esquentava e João logo contou em detalhes como sua ex-mulher o matara com sete facadas no peito, por ter sido ele o único capaz de fazê-la se sentir bem. Maria contou como resolvera acelerar mais do que normalmente depois de ser demitida e atravessara um farol vermelho na frente de um caminhão.
Já planejavam uma eternidade juntos, João e Maria, quando a família de João optou por cremá-lo. Maria apodrece triste.

Chega de brincadeiras, vamos escrever a sério.

Era uma noite sem estrelas, sem lua e sem vida. Tais quais zumbis, adolescentes e jovens adultos insistiam e balançar seus corpos flácidos em cada boate da Cidade. As diferentes músicas enchem o ar de um barulho arritmado, uma sinfonia de sons estridentes e dissonantes. Em algum canto da Cidade, está João.
João é João, somente. Não se pode dizer que vive, balança, como os outros zumbis, seu corpo no ritmo das músicas e dos sons que o cercam. Mas João já foi diferente. Foi morto num assassinato cruel quando pela primeira vez lhe invadiu o nada.
Maria é triste. Seus olhos tristes espelham essa tristeza patética de se saber abaixo das expectativas e do potencial.
O corpo de João se aproxima do de Maria. Suas almas se tocam. Nos olhos de João, Maria vê uma trilha de migalhas.
Nos olhos de Maria, João vê um pássaro faminto.
João se aproxima de Maria.
'Eu sei.'
'Eu também.'
Voltam a se afastar. Procuram-se mutuamente com o olhar, mas a música que guia seus corpos não permitem que se aproximem. 'Eu sei', 'Eu também'.
João e Maria não querem voltar pela trilha de migalhas que, aos poucos, vai sendo devorada, mas também não querem se aventurar a chegar na casa da bruxa. A correnteza de sons não os deixa decidir, suas vidas pré-traçadas os obriga a saber que sabem, mas não lhes permite saber o quê.
Tantos Joões (Joãos?), tantas Marias, tantas migalhas e pássaros, tantas melodias, notas, tons e sons. Tantas opções e tantos desperdícios.
João avista a casa da bruxa. 'Eu só queria ter ido atrás de Maria'.
Maria avista a casa da bruxa. 'Eu só queria rever João'.
Mas a correnteza é forte e falta vontade aos dois.
Nem João virou pássaro, nem Maria o enfeitiçou.
Eis a história de João e Maria.